Atleta Oscar Pistorius finalmente começa a viver seu sonho olímpico
Jamil Chade - O Estado de S.Paulo
LONDRES - Foi em Londres em 1908 que o pai do movimento
olímpico, Barão Pierre de Coubertin, fez a declaração que marcaria o
espírito dos Jogos: "O que importa não é vencer, mas competir". Poucas
vezes esse princípio foi tão válido como no caso de Oscar Pistorius. Aos
25 anos, o atleta sul-africano entrará para a história no próximo
sábado ao se tornar o primeiro homem a competir nos
Jogos Olímpicos com as duas pernas amputadas.
Após superar o preconceito, suspeitas, obstáculos legais e seus
concorrentes, Pistorius, ou o "Blade Runner", entrará na pista de
atletismo com parte de sua missão já conquistada. Mas não quer parar por
ai. Sua meta é a de passar para as semifinais e, acima de tudo,
convencer o mundo de que ele deve ser tratado como um atleta como
qualquer outro. E vai além: diz que chegará ao pico de seu desempenho no
Rio em 2016 e corre por um lugar na final em quatro anos.
"Só por estar aqui já atingi meu objetivo", disse. "Mas, assim que vi
que estava classificado, uma pressão foi substituída por outra e agora o
que quero é chegar até as semifinais e depois ir ao Rio em quatro anos e
tentar chegar até a final", declarou.
Pistorius teve suas duas pernas amputadas quando ainda tinha onze
meses de idade. A recomendação dos médicos era de que a operação fosse
realizada antes de que ele aprendesse a andar, para reduzir o trauma.
"Tive uma infância muito normal. Nunca vi diferença entre
deficiência e habilidade", comenta o atleta. "Minha mãe gritava pela
manhã antes da escola ao meu irmão: 'coloque o sapato' e para mim
'coloque a prótese' e não se fala mais nisso", contou. Foi dela que
Pistorius levou parte de sua força. "Ela me dizia que os perdedores eram
aqueles que não participam. Não aqueles que ficam por último", disse.
Nos anos que se seguiram, o sul-africano praticou vários esportes e,
em 2003, após sofrer um acidente jogando rúgbi, teve de buscar uma nova
modalidade. Os médicos sugeriram atletismo e, três semanas depois de
começar a treinar, se deu conta que já havia quebrado o recorde
paraolímpico. Sete meses depois, ganharia sua primeira medalha de ouro
nos Jogos Paralímpicos de Atenas em 2004. Em 2008, em Pequim, deixaria a
Paralimpíada com três ouros.
Mas, junto com a sensação que gerou pelo circuito, o sul-africano foi
cercado por suspeitas e ataques. Pressionada por alguns atletas e
treinadores, a Federação Internacional de Atletismo o proibiu de
competir entre os atletas sem problemas físicos. O caso chegou ao
Tribunal Arbitral dos Esportes que, após ampla investigação, concluiu
que o sul-africano poderia competir, sob a condição de que utilizasse
apenas a prótese que já dispõe, e não outras mais velozes ou mais leves.
"Essa prótese existe desde 1996 e outros atletas já a usavam. Se era
uma vantagem, porque é que outros não conseguem fazer o mesmo tempo que
eu?", questionou, lembrando que 70% dos atletas nos Jogos Paralímpicos
usam o mesmo instrumento. "Alguns dizem que tenho vantagem por ter menos
peso na perna e há um monte de teorias. Mas, se ela fosse tão incrível,
como é que outros não teriam chegado ao mesmo resultado?", insistiu. "A
verdade é que não há vantagens. Preciso usar meu corpo como qualquer
um, tenho de me sacrificar, de me preparar. Para fazer 400 metros, tenho
que trabalhar duro", disse ao Estado.
Sucesso. Sebastian Coe, presidente do Comitê
Organizador dos Jogos, aposta no sul-africano como uma das sensações de
público e em sua presença para colocar os Jogos na história do esporte.
"A resposta das arquibancadas será incrível", disse o ex-corredor,
lembrando que no centro de Londres crianças fizeram filas nesta semana
para obter o autógrafo do atleta.
Ele garante que está "em ótimo estado físico" para competir no
revezamento nos 400 metros e na prova individual. Mas afirmou que sua
carreira não acaba em Londres. "Quero ir para o Rio em 2016. Será lá que
estarei no pico de minha condição. Já estou ansioso para ir ao Brasil.
Terei 29 anos e acredito que estarei melhor. Tenho muito trabalho para
fazer até lá. Mas adoraria concorrer por uma vaga na final contra os
melhores atletas do mundo nos 400 metros."
"Londres já está fazendo um grande trabalho ao sediar os Jogos. Mas
estou certo de que o Rio de Janeiro estará à altura e pronto para um
evento muito colorido em 2016", finalizou.